Icict debate comunicação, cultura e democracia em Manguinhos

por
Alexandre Borba
,
05/09/2014

Texto: Alexandre Borba (Coordenadoria de Cooperação Social da Fiocruz)

O Salão Internacional da Escola Nacional de Saúde Publica (Ensp/Fiocruz) foi o palco, em 28/08, da realização do Seminário “Comunicação, Cultura e Democracia em Manguinhos”, organizado pela Coordenadoria de Cooperação Social da Presidência Fiocruz. O seminário trouxe à tona algumas iniciativas decorrentes do território de Manguinhos que buscam contribuir para a ampliação do debate sobre a produção endógena e autônoma de cultura, comunicação e informação num contexto de territórios socioambientalmente vulnerabilizados. A formatação do seminário contou com uma mesa de palestrantes que fizeram suas explanações sobre o tema para que fossem feitas intervenções do público presente.

Nísia Trindade (Vice Presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz), na fala de abertura, destacou que a perspectiva do encontro coaduna com as políticas que a Fiocruz vem adotando “pensando no binômio: Comunicação e Democracia”. Citou, como um dos exemplos, “a Política de Acesso Aberto ao Conhecimento que, dentre outras, não se volta apenas à comunidade de pesquisadores, mas para a sociedade como um todo”.

Alex Vargas (Assessor da Agência de Comunicação Comunitária de Manguinhos) apresentou o jornal impresso “Fala Manguinhos” como resultado parcial do processo de construção coletiva da Agência de Comunicação Comunitária e enfatizou que essa ferramenta busca dar visibilidade às questões sobre os aspectos civil, cultural, social e ambiental do território de Manguinhos. Segundo ele, em suma, a Agência se definiu com o intuito de “combater os preconceitos, problematizar, informar e afirmar sobre os direitos e deveres republicanos”.

Felipe Eugênio (Coordenador do Ecomuseu de Manguinhos/REDECCAP) contextualizou o processo de construção e atuação do Ecomuseu de Manguinhos, na produção de cultura e comunicação contra hegemônicas, a partir de uma problematização sobre a “não garantia dos direitos civis, justamente, num Estado de Direito”. Apresentou, também, dados que compõem a ilustração do mapa da comunicação social no Brasil para debater sobre o monopólio dos meios de comunicação e sobre o uso de recursos para a criação, desenvolvimento e manutenção deles.

Da esq. para a dir.: Leonidio Madureira, Umberto Trigueiros, Pedro Veiga, Alex Vargas, Felipe Eugênio. Foto: Edilano Cavalcanti

Fez, sobretudo, proposições que considera essenciais para o contexto de democratização da cultura e comunicação, popular, com foco na redução das desigualdades sociais para o desenvolvimento de um território e cidade saudáveis. Dentre elas, a primeira trata da “distribuição equânime de recursos que passa por estimular grupos que são considerados informais a se capacitarem para dialogar com o Estado a partir, por exemplo, de editais”. A segunda é que “a distribuição dos recursos deveria ser baseada em cartografias da cidade que apresentam os pontos vulnerabilizados, criando um novo paradigma para o planejamento do orçamento da cultura” e, na terceira proposição, Felipe destaca que “as agendas de cultura têm que ser pactuadas com a sociedade civil, respeitando suas demandas e preferências ao invés de apontar para uma necessidade de mercado”.

Pedro Veiga (Coordenador do Rio+Social / Instituto Pereira Passos) apresentou o projeto do “Mapa Participativo da Cidade do Rio de Janeiro”, impulsionado pelo mapeamento participativo de Manguinhos, e ressaltou a contribuição desta ferramenta no processo de democratização e divulgação da cultura, dos espaços, da informação, das contradições locais e da cidade. Afinal, “como falar de democracia, de cidadania e de cidade integrada, se ainda se tem um desconhecimento grande do quê é a cidade, do histórico dela e até da formação geográfica do Brasil?” A outra questão ampliada, a partir de Manguinhos, problematiza a geração e exportação de informações turísticas e diagnósticas sobre a cidade do Rio de Janeiro, para o Brasil e para o mundo, no tocante ao fornecimento de informações sobre espaços, bens e serviços.

Umberto Trigueiros, diretor do Icict, encerrando o momento de explanação dos palestrantes sobre o tema, ressaltou que “o campo da comunicação é um campo de conflitos, onde as relações de poder ficam muito claras, especialmente na determinação sobre o como e a que horas a população vai se informar e trabalhar suas preferências culturais, estando, os meios de comunicação, contraditoriamente, subordinados a concessões de mercado em detrimento as concessões públicas”. Isso exposto, o diretor do Icict levantou a seguinte questão: “nesse campo de conflitos, como se expressam os interesses da população, dado a existência de um arcabouço legal de normatizações sobre a produção e veiculação de comunicação, em especial de rádio e TV, que foi estabelecido pela hegemonia política que atende, prioritariamente, aos interesses de mercado?”.

É a partir desta questão que, Umberto Trigueiros, chama atenção para a importância da aproximação e participação popular junto ao Estado no processo de produção de políticas públicas de comunicação, destacando que o fundo nacional de telecomunicações está “praticamente intocável”. Por fim, propõe “o estímulo de políticas e iniciativas que facilitem a possibilidade de autonomia da construção da comunicação e da informação, através de redes comunitárias, de jornais que a população possa produzir, do fortalecimento da tv pública, do aumento do fórum de debate e, da defesa de uma política de acesso aberto à comunicação e a informação não somente na área da saúde. Sobretudo, que a produção de comunicação e informação deve estar a serviço dos interesses da população sobre aqueles de mercado”.

No condizente às intervenções do público, André Lima (Morador de Manguinhos – DESUP), demonstrou preocupação em relação à dificuldade de diálogo existente entre o poder público e os moradores de Manguinhos, destacando que “o processo de escuta em relação ao poder público é muito difícil, visto o exemplo, dentre outros, que envolve a coleta de lixo. Era uma questão que estava dando certo, tinha a aprovação da população e precisava ser ampliada, mas as lixeiras submersas foram recolhidas pela Prefeitura que tampou os ouvidos e ignorou a opinião dos moradores, trazendo novas lixeiras móveis que são constantemente violadas e também utilizadas por usuários de crack para o transporte de materiais recicláveis e vira até abrigo”.

Outra preocupação foi levantada por Leonardo (Morador do Mandela I) e está relacionada à questão da divulgação da violência no território. O morador quis saber se “já está, ou poderá ser, colocada à violência do Estado?”. Especificamente, Leonardo quer saber sobre as mortes que acontecem em Manguinhos em função dos conflitos armados. Tais questionamentos fazem parte da realidade da cidade e, em especial, das favelas. Isso contribui para que estas últimas sejam caracterizadas enquanto territórios socioambientalmente vulnerabilizados. As ferramentas de comunicação - como os jornais impressos e digitalizados e, os dispositivos de rádio e tv comunitários - terão o caráter de produzir circulação e dar visibilidade a essas e outras demandas locais e da cidade; já no caso do mapa participativo é possível identificar o potencial de provocação para se estabelecer o diálogo com o poder público, objetivando a proposição de políticas públicas tais como a de comunicação, segurança, ambiental e, inclusive, saúde.

Jorge Luis (Secretário do Conselho Comunitário e da Agência de Comunitária de Manguinhos), no fechamento das intervenções do público, frisou a importância das iniciativas, aqui, apresentadas e discussões levantadas para a afirmação/exclamação da necessidade urgente de “construção de redes institucionais territorializada, pensando que a partir dessa construção é possível perceber um diálogo maior entre Organizações de Base do Território com Instituições do Estado” e, propôs a construção e multiplicação de espaços “de debate que deem conta de potencializar essas relações entre territórios socioambientalmente vulnerabilizados e Instituições e setores do governo, para que, de forma contínua, sejam promovidas e construídas propostas”.

 

Para saber mais

Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz)
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