Quando o antídoto pode se tornar veneno

por
Alessandro Pereira
,
15/08/2007

Numa tarde de domingo, o securitário George Darío descansava com a mulher, Ana Lúcia, e seu filho, de 2 anos, brincava sozinho. Sem querer, o menino ingeriu um comprimido para hipertensão que os pais haviam esquecido em cima da mesa. “Nós sempre mantivemos a caixa de remédios no alto, para ele não mexer. Em apenas um descuido aconteceu esse acidente. A sorte é que moramos perto de um hospital e em 30 minutos foi possível fazer uma lavagem estomacal”, lembra George. Episódios como esse, infelizmente, são bastante comuns. Um levantamento realizado pelo Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), coordenado pelo Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica (Icict) da Fiocruz mostra que em apenas um ano foram registrados no Brasil mais de 80 mil casos de intoxicações e em quase 25% dos registros, as vítimas tinham até cinco anos.

Os medicamentos estão em primeiro lugar no ranking de intoxicação e vitimaram, em média, mais de 20 crianças por dia. Foi quase uma vítima por hora. Entre as medidas apontadas por especialistas e que podem minimizar os riscos de acidentes domésticos, está o cuidado de não estocar medicamentos em casa, após o término do tratamento.

Sancionada em maio de 2006, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 80/2006 prega que farmácias e drogarias ofereçam aos usuários medicamentos em quantidades individualizadas, que atendam apenas às suas necessidades terapêuticas. “Tal medida permite que o consumidor pague somente pelo que precisa e evita a manutenção de farmacinhas em casa, o que facilita o acesso das crianças e pode causar trocas de medicamentos, além do risco do consumo de remédios fora da validade”, alerta Rosany Bochner, coordenadora do Sinitox.

A resolução da Anvisa prevê que as farmácias e drogarias devem receber uma autorização da Agência, que permita a venda fracionada. Mesmo assim, os estabelecimentos devem exigir a apresentação da receita médica com a especificação da quantidade do medicamento, adequada ao tratamento. Além disso, os produtos têm que estar acondicionados em embalagens especiais com a indicação de fracionamento. A bula e informações como fabricante, lote e data de validade devem acompanhar todas as vendas. O fracionamento deixa de fora apenas produtos líquidos ou de venda controlada.

O acesso aos medicamentos fracionáveis e a desinformação da população dificultam o cumprimento da RDC na prática. Nossa reportagem percorreu dez farmácias e drogarias em diferentes bairros do Rio de Janeiro e apenas duas trabalhavam com venda fracionada. O universitário Thiago Navegantes, que comprava remédio após sofrer uma contusão durante uma partida de futebol, ficou surpreso ao saber do recurso do fracionamento. “Não conhecia essa lei, mas a partir de agora, quero comprar remédios fracionados. Já tenho muitas sobras em casa”, admite.

 

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Para saber mais

Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz)
Av. Brasil, 4.365 - Pavilhão Haity Moussatché - Manguinhos, Rio de Janeiro
CEP: 21040-900 | Tel.: (+55 21) 3865-3131 | Fax.: (+55 21) 2270-2668

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