Palestra sobre crack - Caco Barcellos

por
Graça Portela
,
16/04/2013

O jornalista Caco Barcellos iniciou sua apresentação com duas observações que vem fazendo ao longo de sua trajetória cobrindo temas que abordam a injustiça social e a violência: “O problema do crack é a cachaça. O problema do crack é a falta do pai”. Caco falou de sua experiência ao escrever o livro “Abusado, o dono do Morro Dona Marta”, onde enfoca o tráfico de drogas existente nos morros do Rio de Janeiro, o surgimento de grandes traficantes e seu relacionamento com a comunidade.

De seu contato com os jovens da quarta geração de traficantes no Rio de Janeiro, Caco Barcellos ouviu de alguns de seus entrevistados: “Aí, otário, me responde essa pergunta: por que é que o filho do bacana tem sempre duas mães e a gente não tem mãe nenhuma de segunda a sábado?”. Para o jornalista, essa mãe – nesse período – estaria trabalhando nas casas “do asfalto” para sustentar seus filhos, uma vez que aquele pai ou “morreu quase sempre cedo, por conta da cachaça, ou abandonou a família por conta do álcool, ou foi morto pelas tropas de elites não só do Rio de Janeiro, como as que operam em todo o país.”

Caco foi também extremamente crítico à atuação das forças policiais nas comunidades, que – segundo ele – “matavam jovens sobretudo pobres e negros”. Ele citou os 1.350 autos de resistência registrados no Estado do Rio Janeiro, em 2007, referentes ao confronto entre policiais e população, e lembrou: “na China, onde a pena de morte é permitida, no mesmo ano, 600 pessoas foram mortas.”

O jornalista lançou um desafio à plateia – de estudantes, pesquisadores, docentes, cientistas sociais e comunidade: “Duvido que vocês conheçam de perto algum desses 1.350 indivíduos, que em nossa cobertura jornalística não passam de número. Desconhecemos a história deles.” Para ele, a imprensa vê o mundo pela ótica da cidade. “A imprensa vai até onde chega a cidadania” e continuou: “Se observarmos da maneira como é divulgada, conhecemos a história pela versão oficial do estado matador, pois as vítimas estão sempre sendo associadas a consumidores de droga, ou a traficantes de droga”, concluiu.

Em relação ao crack, Caco Barcellos lembrou que fez a reportagem da primeira apreensão da droga no país, em 1992, para o programa Globo Repórter. Ele recordou que 21 anos depois fez uma outra matéria para saber o destino dos personagens que eram usuários da droga. Apenas uma estava ainda viva, havia se formado em jornalismo e acabou trabalhando nesta matéria juntamente com os jovens do programa Profissão Repórter, do qual Caco é diretor.

Barcellos não se absteve criticar a imprensa como um todo: “Com o passar dos anos, foi aumentando o consumo do crack nas comunidades. Mas (as notícias sobre crack) só chegaram à mídia, porque começaram a atingir pessoas do asfalto. Aí, passou a ser um assunto de urgência para a mídia, que me parece mais atenta às questões que tocam as pessoas mais privilegiadas. Enquanto foi a droga dos mais pobres, estava lá no esquecimento.”

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