Sinal de alerta para a alimentação infantil

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Assessoria de Comunicação do Icict/Fiocruz
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02/08/2019

Um estudo – “A study of the availability, composition and marketing of baby foods in four European countries” – sobre rótulos de alimentos para crianças de zero a 36 meses em três países europeus (Áustria, Bulgária e Hungria) e Israel, divulgado recentemente pela Organização Mundial de Saúde (OMS), mostrou a concentração de altas taxas de açúcar, gorduras e sal nos alimentos infantis, apesar de as propagandas mostrarem o contrário. O risco é que seja gerada, no bebê, uma pré-disposição em consumir mais sal, gorduras e açúcares.

Para Cristiano Boccolini, pesquisador do Laboratório de Informação em Saúde (LIS), do Icict/Fiocruz, os resultados dessa avaliação “são preocupantes”. Ele aponta que “a quantidade excessiva de açúcar – tais como sacarose, maltodextrina ou frutose de alta densidade – em quase todos os alimentos é viciante; crianças com menos de dois anos expostas ao açúcar, tendem a adquirir o hábito de consumi-lo, o que pode trazer problemas futuros relacionados a diabetes e obesidade”, argumenta.

O segundo grande problema encontrado no estudo foi a falta de direcionamento, ou melhor, a indicação correta nos rótulos, da faixa etária atendida. “Os rótulos mostravam que eram próprios para consumo antes dos seis meses de idade ou davam a entender isto, o que vai contra as diretrizes da OMS, que preconiza que crianças até seis meses de idade devem ser alimentadas exclusivamente com o leite materno”, explica Boccolini. A exceção são os casos em que a mãe não pode amamentar por fazer uso de antidepressivos, drogas de abuso e ilícitas, por exemplo, ou é portadora de HIV, HTLV, herpes simples, hepatite C, varicela ou doença de Chagas – nestas ocorrências, a criança poderá consumir alimentos complementares ou fórmulas infantis.

Alimentando o bebê

No Brasil, graças a NBCAL – Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes e Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e Mamadeiras, a situação é diferente. A norma estabelece parâmetros para as práticas de propaganda e marketing das indústrias de alimentos, mamadeiras, bicos e chupetas, regulando a proteção à amamentação. Além disso, o país segue o Códex Alimentarius, onde é necessário especificar, para cada produto, qual o tipo de componentes mínimos que o alimento deve ter e quais os componentes são seguros para cada faixa etária. Mesmo, assim, há necessidade de uma vigilância constante em relação a alimentação dada às crianças.

De zero a seis meses, o bebê conta exclusivamente com a amamentação. A partir daí, até os dois anos de idade ou mais, a criança deve continuar sendo amamentada, recebendo de forma complementar outros alimentos. Estes alimentos oferecidos pela indústria alimentícia seriam as fórmulas infantis ou fórmulas infantis de segmentos para primeira infância e os compostos lácteos. As fórmulas infantis ou fórmulas infantis de segmentos para primeira infância são aquelas voltadas a crianças entre zero e seis meses e de seis a 12 meses, que seguem o padrão universal recomendado pela OMS, que determina a composição de nutrientes segura e adequada para os bebês “esse tipo de fórmula é recomendada para as mães que têm algum impedimento clínico para amamentar”, explica Cristiano Boccolini. 

Já o chamado ‘composto lácteo’, vendido como substituto do leite de vaca e com recomendação de introdução na alimentação a partir de 1 ano de idade, é constituído de “até 51% de leite e 49% de produtos que a indústria quiser colocar lá”, diz o pesquisador do Icict. “Não é leite, são apenas subprodutos do leite, ou seja, aquilo que sobra da cadeia produtiva do leite; o que foi desprezado para fazer a manteiga ou o queijo é transformado em pó e colocam neste composto”, explica Boccolini. O pesquisador do Icict é extremamente crítico em relação a esse produto: “eu chamo de ‘Frankenstein’, pois o produto recebe um rótulo muito parecido com o das fórmulas infantis, com um nome um pouquinho diferente, e ainda são mais baratos que elas, o que induz as mães ao erro e com isso, acabam colocando a saúde da criança em risco”.

Em sua análise, Boccolini também chama a atenção para “os outros 49%”, que são compostos de “óleos de péssima qualidade, como óleo de palma; açúcar, na forma de maltodextrina; vitaminas e sais minerais de baixa qualidade e que são pouco absorvidos pelo corpo da criança”.  

Desvendando os rótulos

Os rótulos são um capítulo à parte para se entender os alimentos infantis. Para os leigos, muitos parecem indecifráveis e não é à toa, como explica Cristiano Boccolini: “do jeito que estão hoje, eles induzem à desinformação”, afirma, “precisamos saber o que está sendo dito ali e que produto é esse que estão falando: é um leite em pó, um composto lácteo, uma fórmula infantil? Existe uma legislação que determina o que são cada um deles e como eles devem ser apresentados”, fala Boccolini.

Uma boa dica é entender como os dois principais vilões da alimentação são identificados nos rótulos:

Os ingredientes normalmente são colocados em ordem decrescente de proporção quantitativa no alimento. “Se você compra um achocolatado e o primeiro componente é açúcar e o segundo é o óleo, significa que esse produto possui uma quantidade maior de açúcar, seguida da de óleo”. A rotulagem ideal, que é adotada no Chile e em outros países do mundo, é a frontal, onde é indicado se o produto tem alto teor de gordura, sódio, açúcar ou de calorias.

O pesquisador do Icict afirma que é importante observar que muitos produtos hoje, mesmo na alimentação infantil indicada para crianças menores de 1 ano, vêm com um excesso de sódio, enquanto que o que é preconizado é que crianças nessa faixa etária não deveriam estar consumindo nenhum tipo de sal adicionado aos alimentos. “No Brasil, as papinhas (alimentos de transição) têm adição de sal e de gordura, e isso é preocupante, pois pode gerar problemas de sobrecarga renal e obesidade”, afirma Boccolini. 

O pesquisador conclui, fazendo um alerta: “se você ler o rótulo e não entender, não compre! Às vezes, aquele produto mais inocente é justamente o mais perigoso”.

 

Crédito

Imagem Comida infantil - Creative Commons
Imagem Alimentos na prateleira - Senado Federal

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Arquivos para download

Alimentação Infantil - Anvisa - Codex Alimentarius

O Codex Alimentarius é um programa conjunto da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), criado em 1963, com o objetivo de estabelecer normas internacionais na área de alimentos, incluindo padrões, diretrizes e guias sobre Boas Práticas e de Avaliação de Segurança e Eficácia.

Alimentação Infantil - Anvisa - Manual de Orientação aos Consumidores

Educação para o Consumo Saudável - Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa

Alimentação Infantil - Ministério da Saúde - NBCAL

Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes e Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e Mamadeiras

Alimentação Infantil - OMS - Commercial Foods

Commercial foods for infants and young children in the WHO European Region - A study of the availability, composition and marketing of baby foods in four European countries

Alimentação Infantil - OMS - Promoção inadequada de comidas infantis

Ending inappropriate promotion of commercially available complementary foods for infants and young children between 6 and 36 months in Europe (June 2019) - WHO

Para saber mais

Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz)
Av. Brasil, 4.365 - Pavilhão Haity Moussatché - Manguinhos, Rio de Janeiro
CEP: 21040-900 | Tel.: (+55 21) 3865-3131 | Fax.: (+55 21) 2270-2668

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