Quando a produção audiovisual vai ao encontro das políticas públicas

por
Daniela Muzi
,
02/03/2015

MinC e Fiocruz investem em editais temáticos de apoio à produção audiovisual


 (Vencedores e representantes da Fiocruz comemoram as cinco novas produções para 2014. Foto: Peter Ilicciev)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A criação artística é um processo comunicativo que preza pela criatividade, mas o que acontece quando arte e criatividade se unem para promover políticas públicas? Essa é a proposta que vem sendo desenvolvida por instituições federais como a Secretaria Audiovisual do Ministério da Cultura (SAv/MinC) e a Fiocruz em seus recentes editais de fomento à produção audiovisual.

O audiovisual em si, em toda sua cadeia e dimensões, está contemplado nas políticas públicas federais, estaduais e municipais que visam fortalecer a produção audiovisual brasileira, a formação de plateia e a geração de emprego e renda. Os exemplos disso são os diversos editais públicos promovidos por entes governamentais, empresas públicas e incentivos fiscais concedidos a empresas patrocinadoras e empresas produtoras de audiovisual. Da mesma forma, as políticas públicas culturais, que integram o Plano Nacional de Cultura (PNC), instituído em 2 de dezembro de 2010, vêm se ampliando e complexificando. O PNC possui três dimensões estruturantes para toda a ação de política pública: a dimensão cidadã, a dimensão simbólica e a dimensão econômica. Visa o planejamento e a implementação de políticas públicas até 2020 voltadas à proteção e promoção da diversidade cultural brasileira. São objetivos do PNC o fortalecimento institucional e a definição de políticas públicas que assegurem o direito constitucional à cultura; a proteção e promoção do patrimônio e da diversidade étnica, artística e cultural; a ampliação do acesso à produção e fruição da cultura em todo o território; a inserção da cultura em modelos sustentáveis de desenvolvimento socioeconômico e o estabelecimento de um sistema público e participativo de gestão, acompanhamento e avaliação das políticas culturais.

Foram previstas, pela Lei 12.343 que criou o PNC, 53 metas estabelecidas com a participação social e dos gestores públicos. Entre as metas que devem ser atingidas até 2020 estão o lançamento de 150 filmes brasileiros de longa-metragem por ano em salas de cinema (meta 21); 60% dos municípios de cada macrorregião do país com produção e circulação de espetáculos e atividades artísticas e culturais fomentados com recursos públicos federais (meta 24) e a disponibilização na internet dos seguintes conteúdos, que estejam em domínio público ou licenciados: 100% das obras audiovisuais do Centro Técnico do Audiovisual (CTAv) e da Cinemateca Brasileira; 100% do acervo da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB); 100% dos inventários e das ações de reconhecimento realizadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan); 100% das obras de autores brasileiros do acervo da Fundação Biblioteca Nacional (FBN); 100% do acervo iconográfico, sonoro e audiovisual do Centro de Documentação da Fundação Nacional das Artes (Cedoc/Funarte) (meta 40).

Diversos programas e ações de políticas públicas de outras temáticas (racial, juventude, gênero) tangenciam o audiovisual em suas práticas. Em meio às comemorações do Dia Nacional da Consciência Negra, em 2012, a Secretaria de Audiovisual do MinC, em parceria com a Fundação Palmares e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir/PR), lançou o Edital de Apoio para Curta-Metragem – Curta Afirmativo: Protagonismo da Juventude Negra na Produção Audiovisual. O edital selecionou 30 projetos de curtas-metragens (ficção, documentário ou animação), dirigidos ou produzidos por jovens negros, de 18 a 29 anos, pessoa física, com temática livre.

Em 2013 foi a vez de gênero e meio ambiente entrarem em pauta, ou melhor, em tela, com o Edital Carmen Santos Cinema de Mulheres 2013 – Apoio à Curta e Média-Metragem e o Edital Curta Animação 2013: Resíduos Sólidos em um Minuto. O Edital Carmem Santos Cinema de Mulheres 2013 foi articulado entre a Secretaria do Audiovisual do MinC e a Subsecretaria de Articulação Institucional e Ações Temáticas da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR). Contemplou 10 obras audiovisuais (ficção, documentário e animação) de até cinco minutos assinadas e dirigidas por mulheres. Os conteúdos das propostas selecionadas, segundo orientação do edital, abordaram a construção da igualdade entre mulheres e homens e os direitos da mulher e a cidadania, levando em conta a diversidade das mulheres nos meios urbano e rural. Uma ação baseada no Plano de Políticas para as Mulheres 2013-2015.

Já o Edital Curta Animação 2013 foi elaborado em conjunto com a Secretaria de Articulação Institucional e Cidadania Ambiental do Ministério do Meio Ambiente (SAIC/MMA) e premiou 40 obras audiovisuais brasileiras de animação, inéditas, com duração de um minuto, que abordaram de forma criativa e inovadora a questão dos resíduos sólidos.

 

Segundo a Secretaria do Audiovisual, o Curta Afirmativo e o Prêmio Carmem Santos são ações afirmativas no campo do fomento e da produção audiovisual, que se iniciaram na atual gestão como forma de fortalecer ainda mais estes atores e potencializar protagonismos. Os editais temáticos têm apresentado resultados em termos do número de projetos inscritos, recebendo inscrições das cinco regiões brasileiras. Foram 315 propostas inscritas no Edital Curta Afirmativo; 159 no Edital Curta Animação; e 417 no Edital Carmen Santos.

A experiência da Fiocruz

A Fiocruz, mantendo o legado deixado pelo fundador Oswaldo Cruz, que já no início do século 20 realizava filmes científicos, fomenta, incentiva e distribui a produção independente de audiovisuais em saúde pública através do Selo Fiocruz Vídeo, uma parceria entre a Vice-Presidência de Ensino, Informação e Comunicação e a VideoSaúde – Distribuidora da Fiocruz. O Edital do Selo Fiocruz Vídeo – uma das linhas de atuação do Selo – chegou em 2013 em sua segunda edição e, diferentemente da primeira, sugeriu temas preferenciais: doenças negligenciadas, história da saúde pública, doenças transmissíveis, doenças não transmissíveis, violência e saúde, saúde da mulher e da criança, saúde do trabalhador e saúde mental. Ao todo foram 47 projetos inscritos, 25 do Rio de Janeiro, 12 de São Paulo, três de Minas Gerais, dois de Santa Catarina, três do Rio Grande do Sul e dois de Brasília, atendendo às expectativas do Editor Executivo do Selo Fiocruz Vídeo e membro do Conselho Curador, Homero Teixeira de Carvalho. “A segunda edição do edital mostrou uma vitalidade e criatividade de proposição das empresas produtoras, atingindo nosso objetivo de inserir a saúde pública no processo produtivo do audiovisual e estimulando a produção independente”, comemora.

Os produtores não têm criado resistência aos editais com temáticas específicas, como comprovam os números de inscrições e aceitações dos grupos audiovisuais. “Os temas propostos, como doenças negligenciadas, são fruto do trabalho dos pesquisadores da Fiocruz, e de suma importância. Sempre são um desafio de linguagem audiovisual, principalmente por tratar de assuntos delicados numa linguagem que deve informar, prevenir e permitir a reflexão na busca de novas soluções. A criatividade é estimulada num momento em que novas formas de contar histórias surgem e têm se diversificado através da possibilidade do uso da internet e de novas mídias”, reitera a documentarista Iêda Rozenfeld, uma das vencedoras do Edital do Selo Fiocruz Vídeo 2013.

Ao todo foram selecionados cinco projetos, dois do Rio de Janeiro e três de São Paulo, que estão sendo produzidos ao longo deste ano e serão lançados em dezembro. As produções serão incorporadas ao catálogo do Selo Fiocruz Vídeo, linha de atuação em parceria com a Editora Fiocruz que comercializa, a baixo custo, para popularizar e democratizar o acesso da população ao conhecimento em saúde pública. Serão títulos sobre tuberculose, crack, cesariana, saúde pública e história da saúde pública, temas bastante procurados no atual catálogo do Selo Fiocruz Vídeo.

Convergências entre cultura e saúde

Vencedores e representantes da Fiocruz comemoram as cinco novas produções para 2014 (Foto: Peter Ilicciev)

A ampliação do conceito de cultura para além das linguagens artísticas (movimento muito próximo ao ocorrido na saúde pública com o conceito ampliado de saúde) fez com que a diversidade cultural das expressões dos grupos sociais fosse representada em diversas formas. Os Pontos de Cultura, por exemplo, buscam potencializar a cultura popular, contribuindo para o empoderamento e protagonismo de novos atores no cenário cultural. Ações como Revelando os Brasis, DOC-TV, Cine Mais Cultura, Programadora Brasil, Núcleos de Produção Digital da SAv/MinC contribuem, dentro do campo audiovisual, para o alargamento da diversidade de atores. Proposta similar à da VideoSaúde que fomenta a produção independente, buscando dar espaço para novas vozes e olhares sobre saúde pública.

Tanto a Secretaria do Audiovisual como a Fiocruz acreditam na potencialidade do audiovisual em transmitir mensagens e visões mundo e, principalmente, promover a reflexão e o debate, tornando-se muito mais que um instrumento: uma estratégia de comunicação. “O vídeo deve ser apresentado antes de uma discussão, atuando como motivador e não como ilustrador”, defende Homero que também é coordenador da Oficina VideoSaúde – da ideia ao argumento, oferecida a cada dois anos pela VideoSaúde. Esse alinhamento de pensamento resulta em propostas convergentes de apoio à produção, distribuição e exibição do audiovisual brasileiro e compartilhamento de conhecimento, mostrando que arte e políticas públicas podem caminhar juntas.

"Os temas propostos, como doenças negligenciadas, são fruto do trabalho dos pesquisadores da Fiocruz, e de suma importância. Sempre são um desafio de linguagem audiovisual, principalmente por tratar de assuntos delicados numa linguagem que deve informar, prevenir e permitir a reflexão na busca de novas soluções. A criatividade é estimulada num momento em que novas formas de contar histórias surgem e têm se diversificado através da possibilidade do uso da internet e de novas mídias”.

Iêda Rozenfeld, uma das vencedoras do Edital do Selo Fiocruz Vídeo 2013, irá dirigir o documentário 'Doenças Negligenciadas - Tuberculose tem cura'

 

 

 

 

"A segunda edição do edital mostrou uma vitalidade e criatividade de proposição das empresas produtoras, atingindo nosso objetivo de inserir a saúde pública no processo produtivo do audiovisual e estimulando a produção independente”.

Homero Teixeira de Carvalho, Editor Executivo do Selo Fiocruz Vídeo e membro do Conselho Curador do edital do Selo Fiocruz Vídeo 2013, prevê novo edital para 2015

(Fotos: Peter Ilicciev)

 
 

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