Saúde e mídia em debate na Fiocruz Bahia

por
Cristiane d'Ávila
,
22/11/2011

“A lógica comercial, do lucro, do poder político, não pode ser a lógica de uma área tão importante como a comunicação. Por isso, a comunicação enquanto direito no país é uma luta.” Com esta afirmação, o representante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Pedro Caribé, abriu, na tarde de ontem (22/11), a mesa-redonda “Saúde e mídia”, como parte das atividades do seminário “Comunicação e Saúde: o trabalho em rede para o fortalecimento do SUS”, realizado na Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia, em Salvador. Participaram da mesa a pesquisadora do Laboratório de Comunicação e Saúde do Icict, Kátia Lerner, e a professora da Universidade Aberta de Lisboa, Natália Ramos.

O seminário, uma iniciativa do Centro de Pesquisa Gonçalo Muniz (Fiocruz Bahia) e do Icict, reuniu, em dois dias (21 e 22/11) de palestras, oficinas e mostra de vídeo, profissionais do campo da comunicação, tendo em vista a realização da 14ª Conferência Nacional de Saúde, que acontecerá de 30 de novembro a 4 de dezembro próximos.

De acordo com Caribé, que abordou criticamente questões como o escasso acesso à banda larga e o modelo de televisão digital no Brasil, defender a concepção da comunicação como direito é esbarrar de forma frontal com os interesses da grande mídia. “No caso da publicidade para o público infantil, por exemplo, a regulamentação da comunicação é tratada como cerceamento à liberdade de expressão e de imprensa, o que de fato é uma distorção propositada da questão”, alerta.

Segundo o pesquisador, na Câmara Federal, os deputados que trabalham com comunicação sob a perspectiva do direito são minoria. “As comissões de ciência e tecnologia que dão os pareceres, as concessões, são basicamente dominadas por “coronéis” midiáticos, políticos que recebem concessões em seus estados e dominam o Ministério das Comunicações, em termos históricos um balcão de negócios na área de radiodifusão, principalmente”, acentua Caribé.

O representante do Intervozes afirma que a luta no momento é pela revisão do marco regulatório das comunicações no país. “Isso impactaria poderes políticos de tradições oligárquicas, e geraria grandes transformações na saúde, na formação educacional do povo brasileiro. O Banco Mundial aponta que o PIB de um país aumenta 1,5% quando se eleva em 10% o aceso da população à banda larga”, argumenta.

A segunda palestra da tarde, “Saúde, comunicação e cultura”, da professora Natália Ramos, da Universidade Aberta de Lisboa, trouxe para a mesa-redonda a questão da importância da comunicação em saúde para o desenvolvimento de competências e instrumentos, com vista à criação de contextos e à implementação de políticas e práticas de saúde.

“A comunicação é um dos componentes básicos da educação em saúde, do desenvolvimento de cidadãos informados, de mudança comportamental, da competência intelectual. Essa área da comunicação e informação em saúde poderá contribuir ao nível dos processos, competências, práticas, estratégias e políticas para promover um melhor funcionamento das organizações de saúde, a qualidade dos cuidados com a saúde e a satisfação do contribuinte”, diz a pesquisadora.

Segundo ela, a comunicação em saúde situa-se em diferentes níveis de ação. “Podemos afirmar que hoje os meios de comunicação em saúde constituem uma das bases fundamentais das políticas de prevenção e promoção da saúde pública e influenciam as atitudes, crenças e comportamentos dos cidadãos”.

A abordagem dos meios de comunicação sobre temas como a epidemia de Influenza H1N1 foi o objetivo da palestra “Observando a mídia. Alguns apontamentos sobre os sentidos da saúde nos jornais”, da pesquisadora Kátia Lerner. O trabalho é parte de um projeto mais amplo do Laces, o Observatório de Saúde na Mídia, cujo objetivo é analisar os modos pelos quais os meios de comunicação dirigem o olhar sobre o campo e os temas específicos da saúde.

“A preocupação com a relação entre mídia e poder está difundida em nosso cotidiano, e varia do extremo ceticismo à extrema crença com relação aos meios de comunicação. Através desta e de outras pesquisas do laboratório, tentamos problematizar essas duas verdades parciais, ver a dimensão arbitrária do que parece ser natural, oferecer propostas contra hegemônicas”, avalia Kátia.

Nesta pesquisa, Kátia monitorou, em dois períodos dos anos de 2009 e 2010, jornais impressos de grande circulação no país, para analisar as diferentes abordagens sobre a gripe suína nestes veículos: O Globo e O Dia (RJ), Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Jornal da Tarde (SP), Jornal do Commercio e Folha de Pernambuco (Recife), Correio Brasiliense (Brasília), Estado de Minas (MG) e Zero Hora (RS). E as diferentes abordagens da doença nestes jornais.

“Observei, de 1º de maio a 31 de agosto de 2009, uma média de sete textos por dia sobre a doença, o que a transformou em um ‘acontecimento midiático’. Em certa medida, os critérios de noticiabilidade acompanharam a curva epidemiológica. Também foi notado, entre inúmeras questões apontadas pela pesquisa, que os jornais falaram da H1N1 a partir de outra do passado, como a gripe espanhola. Ou seja, antecedentes simbólicos são prova da periculosidade da doença. Em outro momento, observou-se a associação da gripe comum com a gripe suína, na tentativa de relativizar o perigo”, explica Kátia.

 

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