Ciência da informação para inclusão social

por
Bel Levy
,
27/10/2016

Em entrevista, a pesquisadora Isa Freire comenta as inovações conquistadas pelo XIII Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (XIII Enancib)


Em outubro de 2012, mais de 700 pesquisadores participaram do XIII Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (XIII Enancib), mais importante evento da área de Ciência da Informação no Brasil, promovido pela Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação (Ancib). Durante quatro dias de programação, mais de 300 trabalhos científicos foram apresentados, em 11 Grupos Temáticos, contribuindo para a troca de conhecimentos, experiências e a produção de conhecimento. Esta edição – a primeira organizada em parceria com o Icict/Fiocruz – potencializou o debate acerca da inclusão social na sociedade em rede e das interfaces entre os campos da Ciência da Informação e da Informação e Comunicação em Saúde.

Em entrevista à Inova Icict, a pesquisadora Isa Freire, presidente da Ancib reeleita para o biênio 2012-2014, comenta as inovações conquistadas por este XIII Enancib, as perspectivas para os próximos encontros e as contribuições da Ciência da Informação para a inclusão social – sua área de pesquisa e atuação.

Inova Icict – Como a área da Ciência da Informação está – ou pode estar – envolvida com a inclusão social?

Isa Freire – O tema central deste XIII Enancib – “A sociedade em rede para a inovação e o desenvolvimento humano” – está totalmente conectado à necessidade de investirmos na inclusão social. Este foi o mote da maravilhosa palestra de abertura proferida pela pesquisadora uruguaia Judith Sutz, que nos apresentou a experiência da Universidade de La República em ações de pesquisa e inovação para a inclusão social. Esta é, sem dúvida, uma questão extremamente atual, em que a Ciência da Informação tem papel preponderante. Vivemos na sociedade da informação, na sociedade do conhecimento – e o acesso a esses bens imateriais é decisivo quando falamos em inclusão social.

O fato é que todas as pessoas têm direito à informação – e hoje a informação está livremente disponível na internet. Então, o que podemos fazer para as pessoas mais simples terem acesso à informação que está na internet? Não só para fazer seus trabalhos e deveres de casa, mas para exercer a sua cidadania, entrar no site da Previdência Social e conhecer os seus benefícios? Como podemos fazer para as comunidades participarem deste processo? Como fazer para as escolas utilizarem criticamente os seus laboratórios de informática?  E como encontrar a informação necessária, precisa, no mar de informações que é a internet? Isso também é Ciência da Informação. Então, eu trabalho com professores e alunos da rede pública de ensino para dotá-los de um mínimo de competências em informação, de forma que eles busquem e encontrem informações relevantes para o seu estudo, o seu trabalho, a sua cidadania. Esse é o meu objeto de estudo.

Inova Icict – A senhora coordena um Laboratório de Tecnologias Intelectuais na UFPB. Qual o trabalho desenvolvido por seu grupo de pesquisa?

Isa Freire – Eu tive a oportunidade de apresentar, no GT 1 – Estudos Históricos e Epistemológicos da Ciência da Informação, uma reflexão teórica sobre as ações do Laboratório de Tecnologias Intelectuais da UFPB (LTi). Este grupo constitui um projeto de pesquisa, ensino e extensão que visa ao desenvolvimento de ações que facilitem o acesso livre à informação científica e tecnológica, de modo a promover reflexões e propiciar competências em tecnologias intelectuais de produção, comunicação e uso de informação.

Trabalhamos a partir da perspectiva de que não basta refletir, criar teorias: as ações têm que se tornar intervenções no mundo; o conhecimento deve ser acessível, para ser aplicado.   A partir dessa premissa, eu criei este laboratório virtual, disponível em http://dci.ccsa.ufpb.br/lti, que integra pesquisadores da UFPB e seus bolsistas. Nele podemos encontrar bibliografia, periódicos nacionais e estrangeiros de acesso aberto, vídeos e muitos outros serviços e produtos à disposição de todos. A apresentação do trabalho foi tão produtiva que suscitou a organização de um seminário, a ser coordenado pelo IBICT, sobre o aporte teórico e metodológico que norteia as ações e intervenções do LTi. Isso será possível porque, em eventos como esse, percebemos que já existe uma larga produção científica na área, já estamos de fato produzindo conhecimento em nosso laboratório, inclusive com dissertações de mestrado sobre o tema.

Inova Icict – Como é o trabalho desenvolvido pelo LTi, na prática?

Isa Freire – Na Paraíba, eu consegui realizar um sonho: o blog da comunidade. Comecei a desenvolver essa ideia no Rio de Janeiro, na Maré, mas não conseguimos avançar para além do protótipo. Em João Pessoa nós conseguimos efetivar essa proposta, com o blog da Comunidade Santa Clara: http://comunidadesantaclara.wordpress.com. Nós criamos o blog com a comunidade, treinamos pessoas da própria comunidade para atualizá-lo e hoje ele tem vida própria. É interessante observar que a comunidade não tem internet – e essa é a segunda parte do nosso trabalho, propiciar o acesso à internet dentro da comunidade.

O mais impressionante desta experiência é que o trabalho de inclusão digital redundou em inclusão social. A presidente da Associação de Moradores da Comunidade Santa Clara, dona Zeza, que luta para efetivar os direitos sociais dos moradores, fez, com recursos próprios, um cartão de visitas:         “A Comunidade Santa Clara está na internet”. Hoje ela vai  às instituições, às empresas, às organizações e entrega o seu cartão. E com isso ela é mais bem atendida, consegue mais parcerias e mais melhorias para a sua comunidade. Dessa forma, percebemos claramente que o trabalho de inclusão digital resulta, sim, em um processo de inclusão social.

Inova Icict – Qual a importância de uma sociedade científica para a Ciência da Informação?

Isa Freire – Reunir pesquisadores, estudantes e instituições que estão dedicados ao mesmo tema é fundamental para a consolidação e o avanço do conhecimento, especialmente em um campo tão recente como a Ciência da Informação, que chegou ao Brasil na década de 1970. Nesse contexto, em que apenas um curso de mestrado em Ciência da Informação era oferecido no país, pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) criou a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação (Ancib), justamente para o fortalecimento desta área no Brasil. Um marco, conquistado há 23 anos, que já nos rendeu muitos frutos, desde a promoção de eventos científicos relevantes, como o Enancib, até o compartilhamento de conhecimentos e experiências em grupos de pesquisa. Um resultado que se traduz, na prática, pelo reconhecimento do Enancib como o mais importante evento de Ciência da Informação do país. Nosso encontro é pontuado pela Capes, nossos anais têm ISBN e são considerados capítulos de livros, e nada disso seria possível sem a coesão proporcionada pela Ancib.

Inova Icict – Nesta 13ª edição do Enancib registramos um recorde na submissão e apresentação de trabalhos, e o lançamento de novos Grupos Temáticos (GTs). Como a senhora avalia essa experiência?

Isa Freire – A inovação certamente é um diferencial desta edição do Enancib – característica que observamos desde a produção do evento até a qualidade dos trabalhos apresentados e a organização de novos GTs. Este ano, foram 11 GTs – algo bastante significativo para uma área com menos de 500 pesquisadores doutores. O recorde de submissão de trabalhos é mais um indicativo da consolidação do evento como um espaço importante para interlocução dos pesquisadores. E todos os trabalhos são de altíssimo nível, o que gerou um aumento também de candidatos ao Prêmio Ancib 2012 – 18 dissertações de mestrado e seis teses de doutorado foram avaliadas .

Merecem destaque os GTs 7 e 8, sobre Produção e Comunicação da Informação em Ciência, Tecnologia & Inovação, e Informação e Tecnologia, que já são consagrados, e os inovadores GTs 9, 10 e 11 – sobre Museu, Patrimônio e Informação; Informação e Memória; e Informação e Saúde. Espero, especialmente, que o GT 11 – Informação e Saúde renda cada vez mais, pois foi criado em minha gestão e estive bastante próxima do grupo em todos os momentos. A criação deste fórum resultou de uma grande mobilização – a solicitação para abertura do grupo continha assinaturas de mais de 70 pesquisadores doutores – e por isso acreditamos que será uma área bastante frutífera.

Inova Icict – Como a senhora avalia a parceria firmada entre a Ancib e a Fiocruz, por meio do Icict, para a realização do XIII Enancib?

Isa Freire – Esta foi a melhor surpresa que recebi nos últimos anos. Este XIII Enancib foi um marco em termos de organização. O Icict lançou um novo modelo para nós, que se tornou paradigmático. Por isso, optamos por transferir para a instituição a coordenação do GT Informação e Saúde. Os coordenadores da próxima edição, que acontecerá em 2013 e Florianópolis, já estão cientes de que é preciso seguir o modelo de referência do Icict. Agora, a expectativa é a melhor possível. Já estamos conversando com o Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) para planejar eventos científicos em colaboração com a Fiocruz-Bahia e o Icict, por exemplo, sobre ontologias, para recuperação das novas áreas da Ciência da Informação.

Gostaria de expressar o meu encantamento em trabalhar com a Fiocruz. Sempre conheci muitas pessoas apaixonadas pela Fundação – e hoje eu sou uma delas, porque entendo porque temos orgulho de ser Fiocruz. Essa instituição foi criada pela paixão de Oswaldo Cruz à Ciência e a Saúde e ele inoculou esse amor em todos os trabalhadores da Fiocruz e, também, em mim.

Inova Icict – Quais as perspectivas da Ancib e dos Enancib para os próximos anos?

Isa Freire – Muitas! E esse é o resultado de um evento científico que, além das apresentações de trabalhos, potencializa de fato a troca de conhecimentos e experiências entre pesquisadores, estudantes e toda a comunidade acadêmica. Ideias inovadoras surgiram neste fórum e vamos colocá-las em prática, como a criação de um portal para os GTs do Enancib, reunindo a sua caracterização, trajetória, produção científica e informações de contato. Isso é fundamental para que os interessados possam se afiliar ao GT, consolidando cada vez mais esses Grupos Temáticos como autênticos espaços de produção de conhecimento. Também formulamos um projeto para a criação de um Museu Virtual da Ancib – que está totalmente alinhado aos objetivos de nossos três novos GTs, sobre Museu, Patrimônio e Informação; Informação e Memória; e Informação e Saúde. Outros eventos também já começaram a ser planejados,como encontros do GT 1 – Estudos Históricos e Epistemológicos da Ciência da Informação, do GT 2 – Organização e Representação do Conhecimento e do GT 11 – Informação e Saúde.

Outras matérias

Editorial Informação livre e acessível
Ciência da informação para inclusão social Em entrevista, a pesquisadora Isa Freire comenta as inovações conquistadas pelo XIII Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (XIII Enancib)
Lei de Acesso à Informação Mais transparência para o cidadão
Novas tendências para a ciência da informação Com recorde de trabalhos, XIII Enancib reforça a articulação entre a área da Ciência da Informação e o campo da Informação e Comunicação em Saúde
Icict na Web 2.0 Seminário “O uso das redes sociais on-line na comunicação institucional” recebeu o diretor de Marketing e Comunicação da IBM Brasil, Mauro Segura, e marcou o lançamento das páginas do Icict no Facebook e no Twitter
Incentivo à pesquisa PIPDT fortalece o compromisso do Icict com o avanço do conhecimento científico e tecnológico em saúde

Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz)
Av. Brasil, 4.365 - Pavilhão Haity Moussatché - Manguinhos, Rio de Janeiro
CEP: 21040-900 | Tel.: (+55 21) 3865-3131 | Fax.: (+55 21) 2270-2668

Este site é regido pela Política de Acesso Aberto ao Conhecimento, que busca garantir à sociedade o acesso gratuito, público e aberto ao conteúdo integral de toda obra intelectual produzida pela Fiocruz.

O conteúdo deste portal pode ser utilizado para todos os fins não comerciais, respeitados e reservados os direitos morais dos autores.

logo todo somos SUS