Vinte anos de Ensino

por
Graça Portela
,
07/02/2017

Icict coordena Pesquisa Nacional que apontará o cenário de uso do crack no país


Com o país transformado em um canteiro de obras devido aos grandes eventos internacionais em 2013, 2014 e 2016, os governos estaduais do Rio de Janeiro e de São Paulo, em parte pressionados pela sociedade e pela mídia, que cobram medidas em relação às cracolândias, mas também de olho no marketing político, deslancharam uma série de medidas para conter o consumo do crack em suas capitais. Dentre estas medidas, destaca-se a discutível internação compulsória de usuários da droga.

Atento ao tema e às possíveis interfaces deste com a comunicação e a informação, o Programa de  Pós-graduação em Informação e Comunicação em Saúde (PPGICS) Icict elegeu como tópico de discussão da abertura do ano letivo 2013 “A informação, a comunicação e a agenda da saúde: o caso do crack”. A palestra, realizada no dia 8/04 no salão de leitura Henrique Leonel Lenzi, da Biblioteca de Ciências Biomédicas da Fiocruz, foi uma homenagem aos 20 anos do Ensino do Icict. Participaram da mesa os pesquisadores Francisco Inácio Bastos, do Laboratório de Informação em Saúde (Lis/Icict, Marcelo Rasga Moreira e Paulo Amarante, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp), e o jornalista da TV Globo Caco Barcellos. A cobertura completa pode ser lida no site do Icict, no link http://www.icict.fiocruz.br/content/palestra-sobre-crack-atrai-publico-r...

Em entrevista à Inova Icict, o pesquisador Francisco Inácio Bastos, que participou da mesa e coordena a Pesquisa nacional sobre o uso de álcool e outras drogas – uma parceria da Fiocruz com a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça – fala sobre o tema, adiantando detalhes da pesquisa.

Como a pesquisa nacional  pode ajudar no combate ao crack?

A pesquisa nacional vem permitindo mostrar padrões e extratos sociais diversos, inclusive substâncias diversas. Embora o motivo que guiou a pesquisa tenha sido o crack, descobrimos outras formas de cocaína fumada, como o merla, o polêmico oxi – que ninguém sabe se existe ou não –, a questão da pasta base. Como também descobrimos várias misturas, por exemplo, tabaco polvilhado com crack, maconha polvilhada com crack. Então, simplificar tudo sob o rótulo crack é na verdade um equívoco. Essa e a primeira razão pela qual eu acho que temos que ter uma pesquisa no âmbito nacional. Acho que o grande problema é que obviamente nós que trabalhamos em pesquisa não temos nenhum controle sobre as políticas públicas.

Quantas pessoas já foram entrevistadas para a pesquisa?

Basicamente, entrevistamos pessoas em cenas de uso nas 26 capitais e no Distrito Federal; em nove regiões metropolitanas e em cidades pequenas e médias. Já estamos na faixa de sete mil pessoas entrevistadas e mais de 32 mil entrevistas.

Houve dificuldades  em relação aos locais mais distantes das capitais?

Há uma ideia equivocada de que os locais mais inacessíveis seriam os mais difíceis de se trabalhar. Mas, se você quer um lugar com dificuldade de trabalho, certamente não são esses grotões. É a periferia de nossas grandes cidades. Se algum lugar é difícil de estimar, esse lugar é, por exemplo, São Paulo.

O crack é uma epidemia?

Temos que distinguir dois aspectos da palavra epidemia. Eu sei que epidemia para o senso comum é o aumento substancial de algo, como crimes, acidentes de carro, etc. Tecnicamente, para nós, pesquisadores, epidemia é uma denominação que depende de uma série histórica. Como epidemiologista, o que eu vejo sem dúvida é uma expansão, e isso é inegável. As apreensões aumentaram, o mercado mudou de conformação, a própria lógica do tráfico é diferente – ela é varejista. O crack é uma droga feita artesanalmente, diferente do refino de cocaína em pó. Enfim, toda a lógica inquestionavelmente mudou, mas o termo epidemia, que vem muito carregado da terminologia das doenças infecciosas, não é um bom termo. Eu diria o seguinte: se você tiver que usar a lógica da epidemia, use-a para o tráfico. Mas, se for em relação ao usuário, não existe sujeito menos contaminante, vamos dizer assim, transmissível de um ato do que um usuário de crack.

Qual o perfil do usuário de crack?

O que estamos encontrando são pessoas com baixo nível educacional, nenhuma ou quase nenhuma inserção social e profissional, com conflito familiar. Ele é um usuário solitário em geral, com algumas interações especificas na cena de crack, não fazendo parte do crime organizado; é um pequeno distribuidor envolvido em pequenos delitos. E não tem o hábito contagiante, é um paciente muito doente, com problemas psíquicos e físicos graves.

Quantas pessoas trabalharam nessa pesquisa?

No componente direto, 500 pessoas foram às cenas. No indireto, pessoas que informam sobre redes com usuários de crack, 300 pessoas. Em campo, tivemos 800 pessoas.

Teremos ou não alguma estimativa do uso do crack no país?

Em relação aos números, saberemos apenas sobre as capitais. Em termos de características dos usuários, teremos um extrato das cidades médias e pequenas.

Em que foi baseada a amostra para a pesquisa?

Procuramos selecionar municípios com alta e baixa proporção de homicídios violentos, supondo que se fôssemos para esses dois extremos, nos primeiros provavelmente haveria cenas de crack e outras drogas, e em lugares com pouca violência, que supostamente seriam lugares com trafico pouco relevante, seria o oposto. Mas, para a nossa surpresa, as coisas não são tão simples assim. Primeiro: a violência tem vários braços e o tráfico de drogas é um deles. Há desmanche de carros, sequestros, assaltos, estelionato, etc. Braços que se comunicam de alguma forma entre si ou às vezes não, às vezes são segmentos específicos. A pessoa que arromba caixa de banco não é necessariamente aquela que trafica, que vende crack, por exemplo.

Quando serão divulgados os resultados da pesquisa?

Fizemos uma primeira análise bastante bruta, não ponderada, que foi apresentada por nossa equipe às autoridades. Com razão, os três ministros e suas equipes que estavam lá presentes, Saúde, Justiça e Gabinete Civil da Presidência, solicitaram uma série de análises gerais para clarificar vários pontos.Estamos trabalhando nesse momento o refinamento das análises que foram coletadas. O gestor público tem perguntas especificas, ele quer saber como está a sua área, a sua região, contrastar, por exemplo, cidades de regiões diferentes. Estamos trabalhando mais os dados para que eles tenham um grau de precisão e, até mesmo, a abrangência que nos foi solicitada. Na verdade, a parte operacional da pesquisa já foi submetida para a publicação em livros da própria Fiocruz.

Então os resultados não serão divulgados de uma só vez?

Criou-se uma ideia – e eu próprio acreditava nela – de ser possível fazer uma única divulgação de uma massa de dados como essa. Não imaginava a complexidade que o trabalho iria ganhar ao longo do tempo. Eu estava muito impressionado com as imagens que via no YouTube ou na televisão, das grandes cracolândias. E não foi isso o que encontramos na prática, o que vimos foi um quadro muito fragmentado.

Não acredito mais que haverá um momento mágico em que tudo isso será sintetizado. Acho que não será possível. O que acontecerá é que teremos que fazer várias sínteses parciais. Vamos divulgar dados científicos para a população, que serão referentes a partes do que estamos fazendo, não há como juntar tudo. A segunda parte é que há algumas questões metodológicas realmente complicadas. Por isso, temos tentado submeter à publicação artigos metodológicos, antes mesmo dos resultados.

LINHA DO TEMPO:

Maria Élide Bortoletto - Diretora  do CICT / 1993-1999

1993

Centro de Informação e Comunicação Tecnológica - CICT

Início das atividades de ensino, com cursos: Aperfeiçoamento em Comunicação e Saúde, Atualização em Sistemas de Informação em Saúde; Ciência, Tecnologia, Saúde e Sociedade; e o Programa de Treinamento em Informática.

1996

Primeira edição do curso de atualização em Análise Espacial e Geoprocessamento em Saúde

1998

Primeira edição do curso de atualização Oficina VideoSaúde

1999

I Curso de Especialização em Informação e Saúde (nível médio, parceria com a ESPJV / COC / Ensp)

Ilma Noronha - Diretora da Unidade / 2002-2008

2002

Inicio da gestão de Ilma Noronha na Direção da Unidade

Criação da Vice-Diretoria de Ensino

2003

Criação da Secretaria Acadêmica do Icict

Criação da Comissão de Ensino

Primeira edição do Curso de Especialização em Comunicação e Saúde.

Mestrado Profissional em Gestão da Informação e Comunicação em Saúde, Ciência e Tecnologia (em parceria com Ensp/CICT/COC)

2004

Primeira edição do Curso de Especialização em Informação Científica e Tecnológica em Saúde (turmas no Rio de Janeiro e Porto Alegre).

2006

Cict vira Icict (agosto) e dá início aos quatro projetos prioritários do ensino:

Projeto de Egressos (coord. Rosany Bochner)

Projeto Memória do Ensino (coord. Kátia Lerner)

Projeto Publicações do Ensino e para o Ensino (coord. Cristina Guimarães e Christovam Barcellos)

Projeto do Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação em SaúdE

2008

Envio do projeto do Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação em Saúde para a Capes e aprovação.

I Encontro de Docentes do PPGICS

Umberto Trigueiros Diretor da Unidade

2009

Início da gestão de Umberto Trigueiros na Direção da Unidade.

Início dos cursos stricto sensu (mestrado e doutorado) do Programa de Pós-graduação em Informação e Comunicação em Saúde (PPGICS).

Inicio dos cursos de atualização em “Cinema Etnográfico” e “Introdução à Educação não-formal em Ambientes Virtuais” (1º curso educação a distância)

2011

Início dos cursos de atualização da Rede Banco de Leite Humano

Aprovação de mais 3 cursos de atualização

Conclusão da primeira turma de mestrado do PPGICS

2013

Conclusão da primeira turma de doutorado do PPGICS

Comemoração dos 20 anos do Ensino do Icict

 

 

 

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